Dr. Francisco Cardoso

Professor Adjunto-Chefe do Serviço de Neurologia da Universidade Federal de Minas Gerais, Ex-Moviment Disorders Fellow. no Baylor College of ledice (USA). É membro colaborador da ABPD.

O que é distonia e por que elas ocorrem?
Distonia é um movimento anormal produzido por contrações musculares repetidas, levando a posturas anômalas e/ou movimentos de torção. Mais de uma centena de causas pode produzir distonia mas em todas elas ocorre disfunção de área do cérebro chamada de núcleos da base.

Como é feito o diagnóstico de distonia?
O diagnóstico de distonia é exclusivamente clínico, não existindo exames complementares que indiquem sua existência.

Existe algum fator hereditário?
Um dos mais significativos avanços na pesquisa de distonia nos últimos anos é a compreensão de que a maioria dos pacientes nos quais não se identifica causa óbvia para esse problema, na verdade apresenta distonia causada por fatores genéticos. Sabe-se que existem pelo menos 9 tipos genéticos distintos de distonia.

Qual a relação das distonias com problemas emocionais?
Distonia é doença do cérebro, não sendo causada por fatores emocionais. Apenas 2-3% dos pacientes supostamente com esse problema, na verdade apresentam postura anormal do corpo causada por problema psicológico. Entretanto, pacientes que já apresentam distonia podem ter esse problema piorado quando sob estresse emocional.

Em 1/3 dos portadores de distonias consegue-se identificar uma causa. Quais são?
Como dito na resposta à primeira questão as causas identificadas são extremamente variáveis e numerosas. As mais importantes, porém, são uso de medicações que antagonizam a dopamina (substância química presente no cérebro), acidentes vasculares cerebrais, trauma craniano, paralisia cerebral e doença de Wilson (doença genética caracterizada por acúmulo de cobre no cérebro).

Nos 2/3 restantes dos portadores de distonias nenhuma causa é identificada. Nesta circunstância, diz-se que a distonia é primária. Explique-nos.
Nesses pacientes, não se costuma identificar lesão na estrutura do cérebro que seja responsável pela distonia. Na verdade, investigações mais recentes mostram que fatores genéticos são responsáveis pela distonia de pelo menos 75% desses pacientes.

Pode-se adquirir a doença por causa do trabalho?
Não existe qualquer pesquisa científica séria que aponte relação de causa e efeito entre ocupação profissional e distonia.

O uso de tranqüilizantes ou medicações contra náuseas que bloqueiam a dopamina (substância química presente no cérebro). É uma das mais importantes causas da distonia. Cite-nos exemplos de produtos farmacêuticos que podem ter a distonia como efeito colateral.
Haloperidol, penfluridol, clorpromazina, levopromazina, flufenazina, tioridazina, pimozida, sulpirida, risperidoa, tíotixeno, periciazina, metoclopramida, flunarizina e cinarizina são alguns exemplos.

Procedimentos fisioterapêuticos, massagens, acupuntura, ajudam no tratamento?
Não há quaisquer estudos que tenham avaliado de modo objetivo o papel dessas formas terapêuticas em distonia. A impressão clínica, porém, é que não são importantes no tratamento desses pacientes.

Há justificativa do uso da politerapia na distonia? Em caso afirmativo quais as drogas que se potencializam?
Em muito poucas circunstâncias, quase sempre quando se trata de pacientes com distonias generalizadas graves e que não tenham respondido a uso de uma única medicação. As combinações mais comuns são anticolinérgicos e baciofeno em altas doses, além de uso de tetrabenazina em associação com pimozida e anticolinérgico.

A distonia pode desaparecer por algum tempo e depois voltar?
Isso costuma acontecer em até 20% dos pacientes com distonia cervical.

A Toxina Botulínica tem trazido bons resultados?
Toxina botulínica é a única terapêutica consistentemente eficaz em distonias focais e segmentares. A depender do tipo considerado, 50 a 100% dos pacientes apresentam melhora substancial com essa medicação.

Existem contra indicações ao uso do Botox®?
Raras: miastenia gravis, esclerose lateral amiotrófica e distúrbios sérios da coagulação. Em grávidas recomenda-se não utilizar por inexistir experiência nesse grupo de pacientes.

Existem alternativas cirúrgicas? Dê sua opinião sobre a abordagem cirúrgica da distonia realizada em alguns serviços dos E.U.A.
Existem mas são reservadas a situações onde todas as opções clínicas falham. Em blefaroespasmo, raramente pode ser necessário o emprego de técnicas cirúrgicas que visam a modificar a musculatura da pálpebra. Em distonia cervical, o princípio fundamental é fazer desnervação dos músculos envolvidos. Os resultados são modestos, comumente são necessárias várias intervenções e não é incomum o benefício inicial desaparecer ao final de alguns meses. Quanto a distonias generalizadas, a técnica clássica consiste na destruição de parte da área cerebral conhecida como tálamo (talamotomia). Em pacientes selecionados, essa cirurgia pode produzir resultado moderado a modesto. Mais promissor, porém, é o emprego da palídotomia ventrolateral lateral (destruição da parte ventrolateral do segmento medial do globo pálido - outra área cerebral). Resultados preliminares de cirurgias itas em número muito reduzido de pacientes
quais foram seguidos por tempo pequeno, sugere que os resultados podem ser muito satisfatórios. Antes dessa técnica ser recomendada fora do contexto de centros de pesquisas, é necessário, porém, aguardar mais estudos para se ter certeza da sua eficácia e segurança.

Existe algum tipo de terapia gênica para o tratamento de distonia?
Não.

Qual a importância na criação de grupos de apoio inclusive com o envolvimento de familiares, a fim de manter atividades de integração social e profissional dos portadores de distonias?
No caso específico de distonia, doença rara, grupos de apoio permitem aos pacientes trocarem informações e combaterem a sensação desconfortável de serem os únicos portadores de uma moléstia rara e incurável. Sob o ponto de vista social, os grupos podem desempenhar importante papel no ajuste da integração social, educacional e profissional dos pacientes. Adicionalmente, em certas circunstâncias (como a Dystonia Medical Foundation nos EUA) os grupos de apoio são importantes fomentadores de pesquisa científica.

O Brasil possui grupos de pesquisa em distonia?
Sim. Aqui em Belo Horizonte nós temos a Clínica de Distúrbios de Movimentos da Universidade Federal de Minas Gerais. Em São Paulo, há vários centros: Hospital das Clínicas da USP, Hospital São Paulo da Escola Paulista de Medicina, Hospital Servidor do Estado, além do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto. Em Curitiba, existe centro no Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná. No Rio de Janeiro, funcionam ambulatórios nas seguintes instituições: Hospital Universitário da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Santa Casa de Misericórdia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro e Hospital dos Servidores do Estado. Em Brasília funciona um centro no Hospital de Base. Por fim, existe também o Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza.

Do ponto de vista da pesquisa médica, congressos de neurologias trazem algum avanço para melhorar a qualidade de vida dos portadores de distonias?
De um modo geral, sim pois nesses encontros costumam ser anunciados, resultados de pesquisas que permitem melhor compreensão das razões pelas quais as pessoas desenvolvem distonia bem como os avanços terapêuticos.

Existe estatística mundial para sabermos os números dos portadores de distonias?
Infelizmente, existem muito poucos estudos epidemiológicos no mundo e nenhum em nosso meio. Entretanto, levando-se em conta pesquisas americanas, para cada um milhão de habitantes há 330 casos de distonia. As formas generalizadas são mais raras, acometendo um em cada 160.000 habitantes dos EUA. As distonias focais são dez vezes mais comuns, sendo que distonia cervical é a forma mais freqüente.


Dr Francisco Cardoso
, Professor Adjunto; Chefe do Serviço de Neurologia, Universidade Federal de Minas Gerais, Ex-Moviment Disorders Fellow. no Baylor College of ledice (USA). É membro colaborador da ABPD.


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© Associação Brasileira dos Portadores de Distorias, 2001