Não é Tique Nervoso

Roberto de Oliveira

Pouca gente conhece a distonia, síndrome que provoca contrações involuntárias dos músculos

O quadro é mais comum do que parece: o paciente faz movimentos bruscos, torce o pescoço, repuxa o braço ou pisca repetidamente os olhos em gestos repentinos e sem controle. Como o distúrbio se torna cada vez mais frequente, começa a via-sacra por consultórios médicos, mas ninguém sabe ao certo o que é. Tique nervoso, problemas psiquiátricos e até alterações na coluna estão entre os diagnósticos mais comuns. Pode ser distonia, um problema que pouca gente sabe que existe.

Ao contrário do tique nervoso que é uma manisfestação semivoluntária, ou seja, o indíviduo tem controle sobre o gesto, a distonia produz espasmos musculares involuntários. Ela pode ser leve, moderada e, em casos raros, grave, quando chega a impossibilitar o paciente de andar e realizar atividades básicas. É classificada conforme a área do corpo afetada (veja quadro).

Não há estimativas oficiais no Brasil sobre a síndrome, entre outros fatores, porque ela ainda é confundida com outras doenças. Com base em estudos epidemiológicos norte-americanos, acredita-se que 30 pessoas em cada grupo de 100 mil habitantes sofra de distonia, calcula João Carlos Papaterra Limongi, 52, especialista em distúrbios do movimento do Departamento de Neurologia do Hospital das Clínicas.

A grande maioria tem causa múltipla e desconhecida. “Sabe-se que a síndrome é provocada pelo mau funcionamento das células do cérebro, por uma disfunção de uma parte conhecida como núcleos da base, grupo de estruturas nervosas situadas na base do encéfalo relacionadas a aspectos importantes do controle motor do corpo”, explica Limongi. “Quando os núcleos deixam de funcionar de modo adequado, alguns músculos se contraem de forma excessiva e involuntária, produzindo os movimentos e as posturas distônicas” diz.

Seu colega Henrique Ballalai Ferraz, 46, professor de neurologia da Unifesp, explica que, entre as causas diagnosticadas, cerca de um terço é provocado por lesões cerebrais, como traumas, derrames, anóxia (falta de oxigenação no cérebro) e até efeito secundário de alguns tipos de medicamentos usados para tratar doenças psiquiátricas.

O problema não escolhe idade para se manifestar, mas geralmente os sintomas são detectáveis a partir dos cinco anos, diz Ferraz. “Nas crianças, apesar de mais rara, a distonia pode evoluir até se tornar generalizada, atingindo todo o corpo. Nos adultos, ela geralmente permance focal, restrita a uma determinada área”, afirma o neurologista do HC.

As Distonias focais que afetam olhos, pescoço e mãos, costumam aparecer na fase adulta, normalmente após os 30 anos. Acima dos 50, surgem principalmente nos músculos das pálpebras, causando piscadas excessivas e forçadas. Geralmente, as primeiras manifestações são quase imperceptíveis. Aparecem apenas em alguns momentos do dia e podem ser desencadeadas por algum ato motor específico, como falar, ler, escrever ou andar. Com o passar do tempo, as contrações tornam-se mais frequentes e intensas.

Distonia não tem cura, mas existem medicamentos, como os relaxantes musculares, que atuam diretamente nos neurotransmissores e controlam a do tipo generalizada, comum na infância. A eficácia, porém, é limitada nos casos focais e segmentares, que atigem adultos.

O botox é outro importante aliado. O efeito paralisante da toxina botulínica pode ser eficiente nas focais e segmentares, porque interfere no processo de contração muscular. Pequenas doses são injetadas diretamente nos músculos afetados, e o efeito dura, em media, três messes.

A cirurgia pode ser aplicada em casos extremos, como por exemplo, em pacientes atingidos por distonia generalizada e incapacitados para atividades básicas - falar, andar, higiene pessoal. Uma pequena parte do tecido cerebral (cerca de 1mm) na região dos núcleos da base é destruída, explica o professor da Unifesp. “Apesar de voltar a ter os movimentos normais, entre os possíveis efeitos colaterais, o paciente corre o risco de ter a fala prejudicada”, diz.

ABPD - Associação Brasileira dos Portadores de Distonia


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