ABPD, 10 anos

Dr. João Carlos Papaterra Limongi

 

Embora descrita ainda em fins do século 19 e conhecida da comunidade médica desde então (principalmente de neurologistas e psiquiatras), as distonias eram, até pouco tempo, completamente desconhecidas do público leigo. Isso de devia a vários fatores: em primeiro lugar, as distonias constituem um grupo heterogêneo de formas clínicas. Essa diversidade decorre da ampla variação de idade de início, de grupos musculares envolvidos e da extensão do acometimento que sempre dificultou sua caracterização como entidade clínica (atualmente a distonia não é considerada uma doença, mas uma síndrome, isto é, um conjunto de doenças que têm em comum a presença de contrações musculares mantidas que produzem movimentos repetitivos ou posturas anormais). Em segundo lugar, em virtude da natureza pouco usual dessas contrações involuntárias, muitas vezes inconstantes e com fatores de melhora e piora pouco compreendidos, muitos pacientes eram rotulados como portadores de "tiques nervosos" ou de algum distúrbio mental. Esse quadro modificou-se a partir da segunda metade do século 20 graças ao esforço de neurologistas como C.David Marsden e Stanley Fahn, entre outros, que organizaram e classificaram as distonias de acordo com critérios clínicos bem definidos.
Em fins da década de 1980, as distonias estavam novamente na berlinda: um novo tratamento para as distonias focais do adulto parecia bastante promissor. Esse tratamento foi preconizado por Alan Scott, um oftalmologista da Califórnia que utilizava uma substância, a toxina botulínica, no tratamento do estrabismo. Como a toxina botulínica tem a propriedade de paralisar os músculos a ela expostos, surgiu, em seguida, a idéia de utilizá-la para o tratamento de doenças dominadas por contrações involuntárias excessivas, como as distonias. Como se sabe, os resultados foram excelentes (principalmente para as formas focais) e seu uso tornou-se universal para as distonias focais e segmentares.
Por essa mesma época, a toxina botulínica começou a ser utilizada em pequena escala em alguns centros do Brasil e, talvez como decorrência dessa nova forma de tratamento, pacientes começaram a aparecer, muitos deles sem diagnóstico mas já doentes de longa data. Estava clara a necessidade de divulgação de informações médicas ao público leigo. Era preciso conscientizar as pessoas que determinados sintomas, facilmente reconhecidos, poderiam ser decorrentes de distonia. E, mais: havia agora tratamento satisfatório para essa condição!
Graças ao esforço pioneiro de um grupo de pessoas, liderado pela sra. Helen de Barros, há exatos dez anos constituiu-se uma associação destinada a congregar pacientes acometidos por distonias em suas várias formas: a Associação Brasileira dos Portadores de Distonias, a ABPD. Como outras associações de pacientes, a ABPD é uma entidade sem fins lucrativos e tem, entre outros, os seguintes objetivos: congregar pacientes com distonias e seus familiares, fornecer informações relevantes para aos vários tipos distonias, divulgar resultado de pesquisas médicas e contribuir para o bem estar físico e psicológico dos pacientes. Como pude testemunhar desde sua fundação, não foi, e não tem sido, tarefa fácil. Havia muitas pessoas que precisavam ser ajudadas mas poucas dispostas a ajudar. Mas a ABPD foi em frente, cresceu e não perdeu de vista seus objetivos maiores. A partir de 1996, passou a ser presidida pela sra Elenita Ferreira de Macedo, outra incansável lutadora, que, com sua equipe, vem levando adiante esse projeto. Ao lado dos boletins periódicos, a construção de um novo site (www.distonia.org.br) vem proporcionando maiores possibilidades de divulgação de informações e de interação com pessoas interessadas. Sua diretoria reúne-se regularmente, possui um conselho médico de alto nível e, graças ao trabalho sério e incansável de seus membros adquiriu, ao longo dos anos, credibilidade no meio médico, empresarial e na esfera pública.
Mas ainda há muito por fazer. É preciso um grande esforço para ampliar o quadro, não dos que precisam ser ajudados (que são muitos) mas dos que podem e querem ajudar e contribuir com uma pequena parcela do seu tempo para tornar a ABPD mais forte e capaz de levar adiante seu ideal.


Dr. João Carlos Papaterra Limongi é médico neurologista, especialista em Distúrbios do Movimento do Departamento de Neurologia do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo. É co-fundador e membro do Conselho Médico da ABPD.


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© Associação Brasileira dos Portadores de Distorias, 2001